As personagens famosas da televisão fizeram (e ainda fazem) muito sucesso com o público. Entre Baila Comigo (1981) e Em Família (2013) muita história de amor aconteceu.
Com quantas Helenas se faz uma história de amor? Manoel Carlos se inspirou na história de Helena de Tróia para suas heroínas e sempre lançou em suas tramas temas polêmicos que mexem com a opinião da sociedade. Mesmo que você nunca tenha acompanhado uma novela dele, certamente sabe o que se passou pelos comentários do público.
Em Baila comigo (Globo, 1981), Helena (Lilian Lemmertz) interpretava mãe que sofreu muito por não poder criar juntos seus filhos gêmeos, João Vitor e Quinzinho, interpretados por Tony Ramos. A cena do primeiro encontro dos dois na televisão foi um marco em tecnologia e dramaticidade na época. Comecei a assistir à novela no Viva, mas confesso que depois do capítulo 70 fui perdendo as forças e passei a assistir apenas momentos específicos. O ritmo lento me deixou um pouco preguiçoso… embora seja inegável a qualidade da trama.
Em Sol de verão (Globo,1982/1983) Abel, personagem surdo-mudo de Tony Ramos procurava sua mãe, utilizando bilhetes impressos por toda a cidade. Na época da novela, segundo Nilson Xavier em seu sitio da internet, o alfabeto da linguagem de sinais passou a ser distribuído nas ruas das grandes cidades. Esta foi uma novela do autor em que não houve uma protagonista chamada Helena, e sim Raquel, (Irene Ravache).
A era das Helenas consecutivas começou mesmo em 1991, com a estreia de Felicidade. A trama, baseada em contos de Aníbal Machado, girava em torno do segredo que Helena (Maitê Proença), mãe solteira, escondia de sua filha, Bia, (Tatiane Goulart) sobre a identidade de seu verdadeiro pai. Essa é, talvez, a que mais gosto! Assisti três vezes e sempre com muita expectativa. Bia (Tatyane Goulart) e Avinho (Eduardo Caldas) eram como amigos de infância pra mim.Num misto de telenovela para adultos e crianças, numa estrutura realista e lúdica, Felicidade tornou-se bastante popular.
O título sugestivo História de Amor, da novela de 1995, ultrapassou a barreira do clichê romântico e a novela tornou-se um grande sucesso. Helena (Regina Duarte), mulher divorciada à procura de uma nova história de amor luta para que sua filha Joyce (Carla Marins) consiga ter uma gravidez confortável na adolescência. O pai da moça, o apresentador de tevê e esportista Assunção (Nuno Leal Maia), sofre um acidente de carro e fica paraplégico. Em sensíveis cenas, a personagem passa a defender a prática de esportes para deficientes físicos. Embora a novela estivesse no açucarado horário das seis, o tema de prevenção ao câncer de mama foi adotado pelo autor. A personagem Marta (Bia Nunnes) descobre ter a doença através do autoexame da mama. Após a exibição do drama de Marta, muitas mulheres passaram a se preocupar e realizar exames preventivos. Uma novela muito bonita, por sinal.
Por Amor (Globo, 1997/1998) foi criada a partir do sucesso de História de amor, numa tentativa de apresentar mais uma Helena interpretada por de Regina Duarte, desta vez num dilema que provocou revolta e admiração dos telespectadores. Na trama, mãe e filha têm filhos no mesmo dia e hospital. O bebê da filha Maria Eduarda, interpretada pela atriz e filha de Regina Duarte, Gabriela Duarte, morre e a avó, no ímpeto do desespero, troca os bebês na maternidade. “O que você faria por amor?” – Há esta altura da trama, o título da novela fora justificado. A verdade é revelada, claro, no último capítulo e o autor deixa a cargo do público a definição de quem cuidaria, de fato, da criança – os pais de verdade ou os pais de criação.
Em 2000, Laços de família trouxe um turbilhão de informações ao público. Helena (Vera Fischer) abdica do amor por seu namorado, Edu (Reinaldo Gianecchini) para que sua filha Camila (Carolina Dieckmann) possa, também, amá-lo. A polêmica estava gerada e a personagem Camila havia tornando-se motivo de antipatia de todo o público. Eis que numa cena de banho da personagem ela sofre um aborto espontâneo – Começa então a nova fase trágica da novela: Camila perde o filho, descobre ter leucemia e, como se não bastasse, escuta de sua mãe que não é filha do pai que a criou. Numa cena impactante, Carolina Dieckmann tem seus cabelos raspados em função da quimioterapia de sua personagem em rede nacional.
Manoel Carlos ousou ainda em Mulheres Apaixonadas (Globo, 2003). A novela tratou de temas como violência contra a mulher, maus-tratos a idosos, violência urbana, câncer e alcoolismo. Pela primeira vez, um casal de lésbicas, interpretado por Aline Moraes e Paula Picarelli não sofreu rejeição do público. Suas personagens ainda tiveram direito a um beijo, mesmo que numa peça teatral encenada na trama. O evento “Brasil sem Armas”, da vida real, contou com a presença dos atores da novela e foi gravado e inserido como sequência do roteiro. A interatividade junto ao público era visível já na abertura da novela. Fotos de telespectadoras foram utilizadas na vinheta, através de campanha lançada pela emissora. A Helena? Christiane Torloni, interpretando uma mulher madura que descobre ao fim da trama ter adotado o filho de seu próprio marido com a amante.
Páginas da vida encerrou o ciclo de Helenas de Regina Duarte, até então. Manoel Carlos, que sempre ambienta suas tramas em bairros da zona sul do Rio de Janeiro. Dessa vez, o drama da obstetra Helena, que adota um dos filhos gêmeos da jovem Nanda (Fernanda Vasconcelos), que morre após o parto. Marta (Lilia Cabral), a avó das crianças, rejeita uma das crianças por ser portadora da Síndrome de Down. A dificuldade vivida por Helena, que adota a criança (Clara, interpretada pela atriz-mirim Joana Morkazel), na luta contra o preconceito e melhor qualidade de vida dos portadores da síndrome foi retratada em mais um grande sucesso da TV Globo, exibido em 2006. Nesta novela houve uma interatividade maior com o público. Ao invés da contratação diária de figurantes para gravações em padarias, bancas de jornal e demais áreas comuns ao Leblon, foram utilizados em cena os verdadeiros padeiros, porteiros e jornaleiros do bairro.
Já Viver a vida foi lançada como grande inovação ao trazer a primeira Helena negra, interpretada por Thaís Araújo. Na novela, a modelo Luciana (Alinne Moraes), discute com Helena e sofre, logo depois, um acidente de ônibus, ficando tetraplégica. O drama da nova Helena é a culpa e o de Luciana, a reabilitação para continuar vivendo a vida, como sugere o título. Ao final dos capítulos também foram exibidos depoimentos pessoais de espectadores que tiveram algum exemplo de superação pessoal, em decorrência de vícios, acidentes, perda de entes queridos.
Infelizmente, a última Helena de Manoel Carlos esteve dentro de uma novela bem chata. “Em família” é tão confusa que não consigo resumi-la sinopticamente, mas vamos lá…
A leiloeira Helena (Julia Lemmertz) é mãe de Luiza (Bruna Marquezine), jovem que possui incrível semelhança com a mãe quando era adolescente. No passado, Helena teve um caso com Laerte (Gabriel Braga Nunes), que no futuro é um músico famoso. Depois de muitos anos, Laerte encontra Luiza num concerto musical e as memórias da juventude vêm à tona. De volta ao Brasil, ele e Helena vivem numa relação de amor e ódio, até que se apaixona ele se apaixona Luiza, gerando uma rivalidade entre mãe e filha. Enfim… uma novela chata, insossa e que pareceu ser escrita em momentos de intenso tédio, não tendo nem de longe a empatia gerada pelas tramas anteriores.
Figuras presentes na TV através das reprises, as Helenas de Manoel Carlos ainda são associadas à categoria das protagonistas sofredoras e heroicas. É comum se confundir, às vezes, mas uma coisa é certa… um dia alguma delas conseguiu mexer com você.
(Caro leitor, cara leitora, parte desse texto foi adaptado do original, retirado da monografia “O ensino de teatro da Faculdade Dulcina e o diálogo com o mercado da telenovela”, de Josuel Junior, esse colunista que vos escreve.)
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