Há 25 anos, Glória Perez escreveu uma novela que misturava o advento da internet, a tradição cigana, transsexualidade e o desaparecimento de crianças. Nunca antes reprisada na TV aberta, ela retorna pela plataforma Globoplay.
A vinheta de abertura criada por Hans Donner já dizia muito sobre a novela futurista de Glória Perez em 1995. Nela, uma cigana dança em seu acampamento e um homem numa casa high tech usa computadores touch screen para fazer o download da moça, que, em segundos, é materializada em sua frente. Tecnologia e tradição se misturam... Explode Coração!
Hoje ela é datada e até ingênua, mas há 25 anos não tínhamos muito contato com os computadores. Uma ou outra pessoa tinha acesso no trabalho, porém, passamos a consumir mesmo (refiro-me à classe baixa) em meados dos anos 2000. Em resumo bem ordinário, a novela "Explode Coração" mostrava a história da Cigana Dara (Tereza Seibltz) sofria um dilema: Estava prometida por sua família a se casar com o lendário Cigano Igor (Ricardo Macchi). Rica, triste e inconformada com a tradição cigana, ela se matricula numa faculdade escondida de sua família. Dara tinha um computador e entrou na rede da internet para conversar com alguém com quem pudesse desabafar (algo como o que foi foi MSN e o que é hoje o Skype). Nessa sala de bate-papo ela encontra o multiempresário Julio Falcão (Edson Celulari). Os dois conversam e esse date fica uma paixão incontrolável.
Dara, Julio e Igor formam um estranho triângulo amoroso. Ela vai morar no subúrbio e lá conhece a mulher trans Sarita (Floriano Peixoto), Lucineide (Regina Dourado) e Edu (Cassio Gabus Mendes). Sarita foi uma personagem incomum em novelas. Era uma mulher trans num período em que esse termo sequer existia. Aliás, é difícil definir se ela era trans ou uma drag, pois fazia shows em cabarés. Edu era um rapaz tímido e superdotado no assunto internet. Ele fingia ser outro homem para conquistar mulheres. Lucineide, por sua vez, era a dona da lanchonete do bairro (algo que "O Clone" e "América" também repetiram com o Bar da Dona Jura e o Tutu do Gomes).
No mesmo mesmo, vivia Odaísa (Isadora Ribeiro), que era mãe do menino Gugu(Luiz Claudio Jr). Em determinado momento da novela, houve um merchandising social... Dudu é sequestrado e Osaísa se junta às Mães da Cinelândia, numa campanha belíssima que misturou ficção e realidade. Depoimentos reais das mães em busca de seus filhos desaparecidos foram incorporados à novela. Ao final dos capítulos, fotos de crianças eram exibidas em slides durantes os créditos. A novela ajudou a resgatar dezenas delas.
Na década de 2000, "Explode Coração" chegou a ser cotada para passar no "Vale a pena ver de novo", porém, seria complicado editar os capítulos com as crianças desaparecidas. Algumas haviam morrido, se recusado a voltar ao convívio em família... Enfim... Questões que dificultariam os usos de imagens. Cogitou-se a ideia de gravar novos depoimentos de mães para exibição nessa reprise, mas a ideia foi arquivada e a novela nunca foi reexibida na TV aberta. Em 2017, passou no Canal Viva, pertencente à Globo.
CURIOSIDADES PECULIARES
"Explode Coração" foi a primeira novela oficialmente gravada no que conhecíamos como Projac, que hoje são os Estúdios Globo. A sede da Globo era no Jardim Botânico e, além de atrapalhar o trânsito, as gravações em cidades cenográficas eram em locais muito distantes. Optou-se então por produzir um grande complexo numa cidade afastada e com pouco desenvolvimento urbano. O projeto, que começou no final dos anos 1980, iria gerar empregos na região. Era o Projeto Jacarepaguá, pró-Jacarepaguá... Pró-Jac. Entendeu o nome?
Lá já era usado para gravações em novelas. Algumas cidades cenográficas foram construídas em Sepetiba, perto do autódromo do Jacarepaguá e na Curicica, onde hoje estão os Estúdios Globo. Locações na Barra da Tijuca também fizeram parte da novela. A modernidade estava em todas as suas etapas.
Outra curiosidade (nem tão positiva) é a interpretação de Ricardo Macchi, ator muito criticado por seu Cigano Igor. Notadamente, ele tinha dificuldades na atuação e isso o estigmatizou como um ator que as pessoas pouco levaram a sério. Mesmo quem não entendia do assunto percebia que as cenas dele eram bem fracas. Ricardo fez outras novelas, mas o Cigano Igor nunca saiu dele.
"Explode Coração" é curtinha... Tem 155 capítulos de duração pequena, não passa por aquele período de barrigas que estendem a tramas. Será uma boa opção para quem quer rever a história ou conhecer o que era ser moderno em 1995. A estreia no Globoplay será na segunda-feira, dia 22 de junho.
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