Quatro artistas – Jussara Miller, Luciana Hoppe, Simone Mello e Marcos Sobrinho – ocupam a Oficina Cultural Oswald de Andrade com oficinas e composições coreográficas, que evidenciam a natureza humana indissociável da natureza planetária
‘Dramaturgias Paralelas’, proposta do Núcleo de Dança e Performance Marcos Sobrinho, ocupa a Oficina Cultural Oswald de Andrade, durante todo o mês de abril, com o “Arrastão de Solos”, reunindo criações de Jussara Miller, Luciana Hoppe, Simone Mello e do próprio Marcos Sobrinho, artistas que atuam em São Paulo, mas que habitam outros eixos culturais fora dos grandes centros urbanos, tendo a natureza como elemento atravessador de suas escolhas estéticas e o meio ambiente ignição para criação. Nos mesmos dias das apresentações, as artistas ministram oficinas relacionadas aos processos de criação de suas obras. As ações são gratuitas
O 'arrastão' começa no dia 1 de abril (segunda-feira), com "O Pescador de Ilusões", de Marcos Sobrinho, um estudo continuado sobre as poéticas do carnaval – do samba, suas diversas influências e rituais presentes no imaginário do povo brasileiro. Inspirado inicialmente no livro “Antropologia da Face Gloriosa”, do artista visual e cineasta brasileiro Arthur Omar, a performance, que evolui como um poema sonoro criado por uma bateria de escola de samba, se lança numa paisagem cênica onde corpos-memórias de uma dança esboça imagens-gestos que atravessam o rito do carnaval. Nesta nova fase da pesquisa, a dramaturgia tem como principal referência o historiador e escritor carioca Luiz Antônio Simas. Em uma se suas obras sobre as tradições ancestrais brasileiras – “O Corpo Encantado das Ruas, História e Arte”, em parceria com Alberto Mussa –, ele aborda a necessidade de entendermos os espaços ocupados pelos desfiles de carnaval como poéticos e políticos. “Trazer uma ideia de corpo-manifesto para esta nova vivência cênica, atualiza nosso rito do carnaval e nos possibilita, de alguma forma, propor um campo aberto de resistência poética-política, um campo que transita entre a celebração e o protesto”, pondera Sobrinho, que vem tendo uma experiência sensorial em meio à natureza e trazendo reflexões que perpassam pelas relações de pertencimento e ao mesmo tempo estranhamento com a nova paisagem. As apresentações acontecem às segundas e terças, sempre às 20h30, até o dia 16 de abril, quando encerra com um bate-papo mediado pela multiartista e arte-educadora Valquíria Rosa.
"Mar Inquieto", solo que Simone Mello apresenta de 11 a 13 de abril, nasceu às margens do Atlântico, na Bahia, em 2011, no rastro do devastador Tsunami que atingiu o Japão levando, com sua magnitude, incontáveis vidas e o sentido de ordem, segurança e bem estar. No dia seguinte à tragédia de proporções monumentais, o coreógrafo japonês Tadashi Endo, durante seu laboratório de Butoh ao qual a artista participava, preferiu dançar para o grupo. “Comovida com sua dança e tomando emprestado do escritor Yukio Mishima o nome de seu livro publicado em 1954, fui inevitavelmente confrontada com a minha condição de vizinhança com o mar. Afetada e movida por estas ondas de informações e sensações, que chegavam como destroços de um terremoto-explosão-nuclear, deixei emergir das profundezas meu próprio Tsunami”, revela Simone Mello, que investiga o corpo-catástrofe e encarna na cena a tensão, o lamento, a perda de sentidos e a tentativa de reconstrução de memórias individuais e coletivas geradas por esse e outros desastres planetários e crise climática, como o rompimento da barragem do Fundão da mineradora Samarco, no município de Mariana (MG), e as chuvas e desabamentos seguidos de morte no litoral de São Paulo, que impactaram a comunidade brasileira. As apresentações acontecem quinta e sexta, às 19h30, e no sábado às 18h. Na sexta (12), após o espetáculo, rola conversa sobre o processo de criação com a mediação da bailarina, socióloga e pesquisadora Talita Vinagre.
"Universo Invisível", de Luciana Hoppe, envolve dança, literatura e ecologia e inspira-se na obra de Valter Hugo Mãe, "Homens Imprudentemente poéticos", que trata da alma humana de forma sensível e intensa, convocando-nos a olhar para a nossa relação com nós mesmos e com os outros seres humanos e demais seres vivos. O trabalho traduz, em imagens corporais e movimento, a sinergia que se dá entre o planeta Terra, enquanto um grande organismo vivo, que permitiu o desenvolvimento de estruturas capazes de adaptarem-se ao meio ambiente, com a Via Láctea, que sustenta a nossa existência, e que, por sua vez, pertence à grande teia cósmica infinita. As apresentações acontecem de 18 a 20 de abril (quinta e sexta, às 19h30, e sábado às 18h) e, na sexta, reserva bate-papo com mediação de Silvia Geraldi, artista, pesquisadora da dança e professora do Departamento de Artes Corporais e do Programa de Pós-Graduação, na Unicamp.
O livro de Ailton Krenak, “Ideias para adiar o fim do mundo”, é motor para a criação de “Verdes e Ouvirdes”, de Jussara Miller, escolhida para encerrar esta primeira etapa do projeto Dramaturgias Paralelas. Dirigido por Norberto Presta, com audiovisual de Christian Laszlo, o solo propõe um diálogo entre dança e fotografia e reflete, de maneira poética e crítica, o impacto ambiental no país. Numa abordagem multimídia, que apresenta imagens fotográficas em movimento, projetadas na tela e no corpo revelando a interface entre dança e audiovisual, “Verdes e Ouvirdes” revela um corpo transitando por densidades reais e oníricas, dançando entre árvores e concreto, banhado em chuva e lama. Um corpo contemporâneo que quer reconciliar-se com a natureza, tentando adiar o fim do mundo e parar o céu antes de sua queda final. “O trabalho aborda a fricção entre ecologia e dança, na urgência deste momento em que testemunhamos por anos o abandono de políticas ambientais em nosso país, atingindo diretamente o ecossistema e, consequentemente, as populações com alta vulnerabilidade”, opina Jussara Miller. As apresentações ocorrem de 25 a 27 de abril (quinta e sexta, às 19h30, sábado, às 18h), com o último bate-papo na sexta, mediado por Pin Nogueira, artista, mestra em Comunicação e Semiótica e professora especializada na PUC-SP.
Para o próximo semestre, está prevista uma segunda fase – “Diálogos em Solos Reunidos” – performance que resultará da dramaturgia experimentada pelos quatro artistas durante as vivências cênicas e pesquisas corporais do projeto Dramaturgias Paralelas, tendo a improvisação como ponto de partida e a questão do Exílio – tema bastante discutido durante os encontros e compartilhamentos -, na visão do filósofo tcheco-brasileiro Vilém Flusser como inspiração.
OFICINAS
Direcionadas a estudantes, educadores, artistas da cena e pessoas interessadas na pesquisa do movimento, serão três oficinas de sensibilização corporal, ministradas pelas artistas Simone Mello, Luciana Hoppe e Jussara Miller, nos mesmos dias de suas apresentações, sempre nas quintas e sextas-feiras, das 13h às 16h, e sábados, das 11h às 14h, totalizando nove horas de estudo prático cada uma.
O laboratório de Simone Mello, “Mar Inquieto – para Dançar Imediatamente, apesar da catástrofe planetária”, convida os participantes a vivenciarem uma itinerância dramatúrgica que incita a provar as corporalidades – corpo inquieto, explosivo, transbordante de líquidos e corpo folia – investigadas nas cenas que compõem a performance “Mar Inquieto”. Acontece nos dias 11, 12 e 13 de abril.
Em “Dramaturgia corporificada”, Luciana Hoppe propõe desenvolver diferentes qualidades de movimento através do corpo sensível, proporcionado pela abordagem somática do Body-Mind CenteringTM, criado por Bonnie Bainbridge Cohen. Dias 18, 19 e 20 de abril.
Por fim, a oficina de Jussara Miller, “A Escuta do Corpo”, irá trabalhar o estado de presença, priorizando a preparação do corpo cênico a partir do referencial somático com a prática da Técnica Klauss Vianna, fazendo uso de vetores que potencializam o fluxo do movimento pelo espaço. Dias 25, 26 e 27 de abril.
O projeto “Dramaturgias Paralelas” foi contemplado pela 34ª edição do Programa de Fomento à Dança para a cidade de São Paulo, da Secretaria Municipal de Cultura.
PROGRAME-SE
Arrastão de Solos – Núcleo de Dança e Performance Marcos Sobrinho
1 a 16/4 (2ªs e 3ªs, às 20h30)
“O Pescador de Ilusões”, de Marcos Sobrinho
*16/4 - bate-papo após a apresentação - mediação Valquíria Rosa.
11 a 13/4 (5ª e 6ª, às 19h30; sáb, às 18h)
“Mar Inquieto”, de Simone Mello
*12/4 - bate-papo após a apresentação - mediação Talita Vinagre
Oficina “Mar Inquieto – para Dançar Imediatamente, apesar da catástrofe planetária”
(5ª e 6ª, das 13h às 16h, sáb, das 11h às 14h)
18 a 20/4 (5ª e 6ª, às 19h30; sáb, às 18h)
“Universo Invisível”, de Luciana Hoppe
*19/4 - bate-papo após a apresentação - mediação Silvia Geraldi
Oficina “Dramaturgia corporificada”
(5ª e 6ª, das 13h às 16h, sáb, das 11h às 14h)
25 a 27/4 (5ª e 6ª, às 19h30; sáb, às 18h)
“Verdes e Ouvirdes”, de Jussara Miller
*26/4 - bate-papo após a apresentação - mediação Pin Nogueira
Oficina “A Escuta do Corpo”
(5ª e 6ª, das 13h às 16h, sáb, das 11h às 14h)
Oficina Cultural Oswald de Andrade
Rua Três Rios, 363 - Bom Retiro, São Paulo – SP
Tel: (11) 3221-5558
Acessibilidade: Sim
Classificação indicativa:14 anos | Duração: 55 minutos cada
Grátis
QUEM FAZ - Solos
O Pescador de Ilusões
Direção Geral, Concepção e Dramaturgia Marcos Sobrinho |Intérprete-Criador Marcos Sobrinho | Design de Luz/Sonorização e Vídeo Instalação Téo Ponciano e Décio Filho |Design de Vídeo e Documentação André Menezes
Mar Inquieto
Concepção e performance Simone Mello | Luz Marco Xavier | Vídeo da performance Marlon Fabian | Produção do solo Cuerpo Fluctuante
Universo Invisível
Performance e idealização Luciana Hoppe | Direção Paulo Marcello | Iluminação Ney Bonfanti |Design de Vídeo e Documentação André Menezes
Verdes e Ouvirdes
Concepção, Coreografia e Dança Jussara Miller | Direção, Dramaturgia e Cenografia Norberto Presta | Fotografia, Audiovisual e Trilha sonora Christian Laszlo | Assistência coreográfica Cora Laszlo | Iluminação Eduardo Albergaria | Figurino Warner Júnior | Arte gráfica Elis Laszlo | Projeto cenotécnico Christian Laszlo
Projeto Dramaturgias Paralelas
Coordenação Geral Marcos Sobrinho |Designer Gráfico Ilana Braia | Assessoria de Imprensa Elaine Calux | Assistentes de Produção Lu Busquets e Lívia Império | Produção Cristiane Klein (Dionísio Produção)
Marcos Sobrinho
Natural de Aracaju (SE) , a formação de Marcos Sobrinho em Dança passa por Maria Olenewa (RJ), Ècole de Danse du Marais (Paris - França), Folkwang Schule em Essen e na Die Werkstätte Düsseldorf, ambas na Alemanha e por Zélia Monteiro nos últimos 15 anos. Fundou o Núcleo de Dança e Performance Marcos Sobrinho com a proposta de investigar o universo da dança em conjunto com as artes visuais, música e vídeo. Já foi contemplado pelo Fomento à Dança para a Cidade de São Paulo, Prêmio Funarte Klauss Vianna, Programa de Ação Cultural – ProAC e Rumos – Itaú Cultural.
Nos seus 26 anos, o grupo vem trabalhando de forma sistemática no campo da dança e performance, estabelecendo conexões entre o fazer/pensar arte contemporânea. Nas investigações cênicas tem sempre abordado as artes visuais como estratégia para as modulações estéticas.
@dramaturgiasparalelas
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